A Escola Municipal “Vicente de Carvalho” – 1924
A Escola Municipal de Bertioga foi instituída em 1906, por lei municipal de Santos. No início, destinava-se exclusivamente ao ensino dos meninos. A partir de 1911 tornou-se uma escola mista, permitindo que as meninas também tivessem acesso ao ensino público. Nessa época, a escola não tinha um local próprio e funcionava em local emprestado por moradores.
Em 1923, Joaquim Tavares e sua esposa Maria do Carmo Pinto de Campos Tavares doam por escritura pública à Colônia de Pescadores o terreno localizado no nº 26, da atual Avenida Vicente de Carvalho. A doação era destinada à construção da sede da Colônia de Pescadores, que também funcionaria como escola para atender aos pescadores associados e moradores locais.
O Jornal A Tribuna de Santos publicou aqueles que foram os responsáveis pelas doações que viabilizaram a construção do prédio da Colônia de Pescadores que serviria também como escola.
No dia 25 de novembro de 1923 ocorreu o lançamento da “pedra fundamental” do edifício. O ato foi feito com muita solenidade, com a presença da diretoria da Colônia de Pescadores e toda a população. Durante a cerimônia, as crianças da escola municipal, acompanhadas da Professora Mariana Leite de Moraes, cantaram o Hino Nacional.
Era um dia histórico para a Vila de Bertioga. Aquele pequeno povoado de pescadores, com alguns comerciantes, começava a ter esperança de que melhorias viriam para tornar mais fácil a vida.
As crianças, orientadas pela Professora, prepararam uma “urna”. Era uma caixa de madeira, com o Jornal A Tribuna de Santos do dia, uma cópia da ata, moedas de prata e níquel, além de cédulas de dinheiro. Nessa época, ainda não tinha esse nome, mas é o que chamamos atualmente de “cápsula do tempo”, ou seja, um recipiente com diversos objetos preparado para ficar armazenado por muitos anos até que seja aberto pelas gerações futuras.
A novo edifício destinado a escola teve suas obras concluídas em 1924.
Os registros históricos mostram que não foi essa a primeira escola de Bertioga. É preciso ir além da memória dos antigos e buscar os registros da época do Brasil Império, assunto abordado em tópicos anteriores.

Escola de Bertioga, localizada no nº 26, da Avenida Vicente de Carvalho

A Escola de Bertioga foi desativada em 1939. Nesta foto de 1940, com crianças da família de João Sabino Abdalla, a escola encontrava-se em ruínas. Posteriormente, foi reformada e serviu como Delegacia de Polícia.
No dia 26 de maio de 1924, a Câmara Municipal de Santos aprovou a indicação subscrita por vários Vereadores para atribuir a Escola Mista de Bertioga o nome de Escola “Vicente de Carvalho”. O Vereador Arnaldo Ferreira Aguiar pronunciou-se, nos seguintes termos:
Sr. Presidente, quero justificar, muito rapidamente, uma indicação que vou ter a honra de enviar à mesa. Trata-se, Sr. presidente, de mais uma homenagem à memória do grande poeta santista, Vicente de Carvalho, a quem não só a Câmara Municipal, como toda a cidade, por seus órgãos mais representativos tem tributado o preito de admiração a que faz jus o nosso ilustre conterrâneo. A indicação é para que seja dado a escola municipal de Bertioga o nome do grande poeta. Naquele lugar, onde ele ia gozar as suas horas de lazer, dedicando-se ao seu esporte predileto, ficará, assim, mais indelevelmente lembrado o seu nome. Indicamos que, em homenagem ao grande santista, Dr. Vicente de Carvalho, seja dada a denominação de “Vicente de Carvalho” à escola municipal de Bertioga. Sala das Sessões, 26 de maio de 1924, Vereadores Arnaldo Ferreira de Aguiar, Dr. Benedito de Moura Ribeiro, Manuel Ribeiro de Azevedo Sodré, J. Carvalhal Filho, J. de Souza Dantas, Belmiro Ribeiro de Moraes e Silva, Benedicto Pinheiro, João Gonçalves Moreira.

No dia 13 de junho de 1937 o Centro de Cultura Paulo Gonçalves prestou homenagem ao poeta Vicente de Carvalho, instalando um retrato dele na Escola Vicente de Carvalho, em Bertioga. Naquela manhã de domingo partiu uma comitiva de Santos: a família de Vicente de Carvalho, o Professor Delphino Stockler de Lima (Inspetor de Ensino, representando o Prefeito de Santos), diretores e associados do Centro de Cultura Paulo Gonçalves, e diversos convidados. Vieram pelo rebocador “Santos”, emprestado por Victor de Lamare. A viúva de Vicente de Carvalho foi convidada a se aproximar e presidir a sessão de inauguração do retrato. Logo após, o presidente do Centro de Cultura Paulo Gonçalves, Durval Ferreira, leu um trecho do poema Luizinha, de Vicente de Carvalho. Não sabemos o trecho que ele leu, mas pode ser este:
É tão pouco o que eu desejo
Mas é tudo o que me falta
Só porque a flor do teu beijo
Pende de rama tão alta.
Ninguém sabe o que-suporta
O mar que chora na areia.
Por essa tristeza morta
Das noutes de lua cheia.
Em baixo o pranto das águas,
Em cima, a lua serena;
E eu, pensando em minhas maguas,
Ouço o mar… e tenho pena.
Ai, minha sina está lida,
Meu destino está traçado:
Amar, amar toda a vida,
Morrer de não ser amado.
Depois da leitura, foi a vez dos alunos fazerem recitais. Por fim, o Centro de Cultura Paulo Gonçalves entregou para cada um dos alunos e aos presentes uma biografia detalhada de Vicente de Carvalho.

Vicente de Carvalho, em retrato de 1902, da Secretaria do Interior do Estado de São Paulo.
Nossa pesquisa não conseguiu confirmar, mas é possível que José Inácio Hora, que até 1924 era “inspetor policial”, tenha assumido, no mesmo ano, a escola no prédio recém-inaugurado pela Colônia de Pescadores. Dados oficiais indicam que em 1939 ele era o professor titular do grupo masculino e Rosalina L. Xavier era a professora titular do grupo feminino. Eram todos professores da rede pública municipal de ensino de Santos.
Essa escola funcionou por aproximadamente doze anos, porque no ano de 1935 já se relatava a impossibilidade de aulas no local. A estrutura do prédio e o telhado estavam deteriorados, colocando em risco a segurança dos estudantes. O então Prefeito de Santos, o urbanista Aristides Bastos Machado esteve na escola e viu as condições precárias da instalação. O assunto ganhou repercussão entre os Vereadores de Santos. Todos estavam conscientes da necessidade de um novo prédio, construído pelo Poder Público, com condições adequadas de servir como escola.

Aristides Bastos Machado (Prefeito de Santos, de 1932 a 1935 e em 1936). É prestigiado também em Santos, por ter iniciado os jardins da Orla da Praia.
O prédio da “Escola Vicente de Carvalho” foi interditado em 1937 pela Inspetora Escolar Professora Alzira Martins Lichti, mas os alunos continuaram a ter aula em outra casa, emprestada por moradores.
Em 1939, a escola passou a funcionar, provisoriamente, em uma outra casa, localizada na esquina da Avenida Vicente de Carvalho com a Rua Irmãos Braga, onde foi instalado o ambulatório da Cruz Vermelha. A escola funcionava em uma de suas salas. Em 1942 a Prefeitura de Santos entrega um novo prédio para a escola, localizado em frente a praia, onde no passado foi o antigo cemitério e hoje é ocupado pela Casa da Cultura.

Professora Alzira Martins Lichti. Inspetora das escolas de Bertioga, em foto de 1938, em Bertioga, em evento no Forte São João, extraída da obra de seu filho, Fernando Martins Lichti, “Poliantéia de Bertioga”.
Alzira Martins Lichti nasceu no dia 7 de setembro de 1894, em Santos/SP. Era filha de Américo Martins dos Santos e de Valentina Guiomar Patusca Martins dos Santos. Foi casada com Armando Lichti, cônsul da Venezuela, em Santos. Formada no Magistério em 1911. Assumiu a função de Auxiliar da Inspetoria da Instrução da Prefeitura de Santos em 1933 (quando começa a frequentar Bertioga) até chegar ao cargo de Inspetora Municipal de Ensino em 1945, aposentando-se no mesmo ano. Faleceu em fevereiro de 1971, em Santos/SP.
Existia também a escola da Enseada de Bertioga (Indaiá), para meninos e meninas, que tinha como Professor Antonio Costa Barros. Essa escola, vinculada ao Município de Santos, precisava ser periodicamente fiscalizada pela Professora Alzira Martins Lichti, Inspetora Escolar do Departamento de Educação de Santos, esposa de Armando Lichti. Segundo o livro “Poliantéia de Bertioga”, escrito pelo filho dela, Fernando Martins Lichti, era o caminhão de João Sabino Abdalla que realizava o transporte da Professora até o Indaiá, ida e volta, nas décadas de 1930 e 1940. Porém, o caminhão nem sempre estava disponível, pois tinha muito serviço, e algumas vezes, para não ficar esperando o caminhão de João Sabino Abdalla, a Professora ia a pé ou de carroça.