A Vila de Bertioga - 1920
Na década de 1920 a Vila de Bertioga mantinha sua vocação turística, atraindo muitos excursionistas que vinham passear e conhecer as ruínas históricas, principalmente do Forte São João e da Ermida de Santo Antônio do Guaíbe. Belle Ribble era uma dessas visitantes. Era educadora, professora, escritora e poeta estadunidense. Chegou ao Brasil em 1920, vindo da Argentina, para assumir a diretoria da “São Paulo Graded School”, conceituadíssimo colégio particular da capital paulista, e que existe até os dias atuais.
Belle Ribble publicou em janeiro de 1930 o livro de poesias “Beneath the white rainbow at Bertioga by the sea”, escrito todo em inglês, revelando suas impressões sobre a Vila de Bertioga nas diversas visitas que realizou, possivelmente, alguns anos antes, em meados da década de 1920. Ela não revela as datas em que esteve em Bertioga. Como o livro foi publicado em 1930, presume-se que esteve em 1929 ou antes, ela demorou para publicar esse livro, e só o fez a pedido dos amigos que insistiram.
O título do livro traduzido significa “debaixo do arco-íris branco”. Belle Ribble, que também assinava como Bel Ribble presenciou em Bertioga um fenômeno raro, o arco-íris branco, formado por um nevoeiro, que disse ter ocorrido no pôr do sol, enquanto os pescadores puxavam suas redes. Mesmo os pescadores e os moradores locais ficaram admirados com aquele raro acontecimento atmosférico, provocado pelas gotículas do nevoeiro e os raios de sol. Disse, “we stood entranced, nor yet could see” (nós ficamos em transe, nem podíamos ver/entender).
Com delicadeza e precisão, Belle Ribble, em seus versos, descreve a Vila de Bertioga: “quaint little thatched-roof town; hid in a mesh of green, close on the channel’s brink” (pequena cidade pitoresca com telhado de palha; escondida em uma malha verde, perto da beira do canal).
Segundo a educadora, Bertioga não tinha polícia, pois raros eram os “malfeitos” e tudo se resolvia dentro dos costumes comunitários. As portas das casas ficavam abertas, assim como a da escola. Era uma comunidade de comida e roupas simples (simple food and clothes). O peixe não faltava e até de graça era possível ganhar uns pescados. O Forte São João estava encardido, cheio de musgos, que davam um tom de verde e escuro, pelas cracas e detritos do tempo. Belle Ribble menciona a “the ponte” (a ponte), referindo-se a primitiva ponte de madeira para atracação das lanchas da santense. São as primeiras impressões de quem chegava em Bertioga: “is a winding channel lined with trees; neat little fruit farms and primitive dock” (é um canal sinuoso ladeado de árvores; pequenas fazendas de frutas e doca primitiva). Na ponte, os pescadores e moradores sempre aguardavam a chegada de parentes ou de pacotes com encomendas ou correspondências. Chegavam muitos visitantes, com roupas estranhas, mas que facilmente faziam amizade nos ranchos que os acolhiam. Belle Ribble visitou o cemitério da praia. Algumas sepulturas eram simples, mas outras eram ornadas com pedras e cruzes, demonstrando que ali estava alguma autoridade, rico ou religioso. Ali, nas ruínas da antiga e histórica Capela de São João Batista, localizada bem no meio do cemitério, que se formou ao redor dela, fez uma descrição curiosa daquela estrutura, chamando “the orchids hall” (o salão das orquídeas), certamente porque observou nas paredes as orquídeas, sem deixar de notar a árvore que nasceu entrelaçada entre as pedras da Capela, e que parecia sustentá-la.
Era um período de transformação. O sistema público de travessia entre Santos e Bertioga estava implantado. Iniciativas de instalação de estabelecimentos comerciais e urbanização para venda de terrenos, transformariam a comunidade de cultura rural, para uma população com características urbanas. Bertioga nasce com vocação para torna-se uma cidade na década de 1920.

Aspecto da Vila de Bertioga na década de 1920. Imediações da atual Avenida Vicente de Carvalho, entre o Forte São João e a ponte de atracação. Foto de Belle Ribble, publicada em “Beneath the White Rainbow”.

A primitiva ponte de atracação e a lancha de transporte público entre Santos e Bertioga. Década de 1920. Foto de Belle Ribble, publicada em “Beneath the White Rainbow”.

“Four centuries look down from this grim old tower” (Quatro séculos olham para baixo desta velha torre sombria). Década de 1920. Foto de Belle Ribble, publicada em “Beneath the White Rainbow”.

“The one little cemetery in the country round; Yet some stone-covered graves, unmolested by time; May have sheltered some martyr; Which lies decayed, no guard at all”. (O único cemitério pequeno no campo; No entanto, algumas sepulturas cobertas de pedra, intocadas pelo tempo; Pode ter abrigado algum mártir, algum padre divino; Que jaz decadente, sem guarda alguma). Década de 1920. Foto de Belle Ribble, publicada em “Beneath the White Rainbow”.

Imediações da Vila e do Canal de Bertioga. Década de 1920. Foto de Belle Ribble, publicada em “Beneath the White Rainbow”.

As palmeiras imperiais próximas ao Forte São João. Década de 1920. Foto de Belle Ribble, publicada em “Beneath the White Rainbow”.

Casa de alvenaria em frente o Canal de Bertioga e próxima ao Forte São João. Década de 1920. Foto de Belle Ribble, publicada em “Beneath the White Rainbow”.

Árvore próxima ao Forte São João, local onde hoje está o Parque dos Tupiniquins. Década de 1920. Foto de Belle Ribble, publicada em “Beneath the White Rainbow”.

Casa de pau-a-pique na Vila de Bertioga. As casas dos pescadores eram de madeira ou de pau-a-pique, mas também existiam casas de alvenaria, construídas pelos proprietários agrícolas, pelos donos de sítios de veraneio ou por Joaquim Tavares. Década de 1920. Foto de Belle Ribble, publicada em “Beneath the White Rainbow”.

A Vila de Bertioga e uma família de moradores. Década de 1920. Foto de Belle Ribble, publicada em “Beneath the White Rainbow”.

Uma das casas da primitiva Vila de Bertioga. Década de 1920. Foto de Belle Ribble, publicada em “Beneath the White Rainbow”.

Um rancho na Vila de Bertioga. Década de 1920. Foto de Belle Ribble, publicada em “Beneath the White Rainbow”.

O padre em frente à praia, próximo ao Forte São João e a capela anexa a ele. Década de 1920. Foto de Belle Ribble, publicada em “Beneath the White Rainbow”.

O padre ao lado de uma das guaritas do Forte São João. O terrapleno coberto por vegetação, musgos, mato, escurecido pela ação do tempo. Década de 1920. Foto de Belle Ribble, publicada em “Beneath the White Rainbow”.

A educadora Belle Ribble pousando elegantemente na praia de Bertioga. Década de 1920. Foto de Belle Ribble, publicada em “Beneath the White Rainbow”.

A praia de Bertioga, a entrada da barra e urubus procurando pelos peixes dispensados pelos pescadores ou que encalhavam mortos na areia. Década de 1920. Foto de Belle Ribble, publicada em “Beneath the White Rainbow”.

A educadora Belle Ribble (terceira, da esquerda para a direita) na praia com amigos e um cachorro. Década de 1920. Foto de Belle Ribble, publicada em “Beneath the White Rainbow”.